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SÍNDROME DE ASPERGER AINDA EXISTE?

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O dia 18 de fevereiro é celebrado o Dia Internacional para Conscientização sobre a Síndrome de Asperger, instituído por ser a data de aniversário de Hans Asperger, um pediatra austríaco que deu o nome à Síndrome. No entanto, à medida que a ciência aprofundou as pesquisas e conhecimentos sobre o assunto, o diagnóstico de Asperger perdeu o sentido e a síndrome foi excluída desde 2003 da versão nº 5 do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais – DSM. Ainda assim, é uma data usada para divulgar o Transtorno do Espectro Autista e as razões da extinção do termo – razões técnicas e científicas e também motivações sociais e humanitárias, pois o médico que deu o nome à síndrome trabalhava para o regime nazista de terror.

Mas o que acontece com as pessoas que antes estavam enquadradas na Síndrome?

Para entender melhor a evolução do termo, o jornalista Sergio Gomes fez a transcrição, para o site da Câmara Paulista para Inclusão, da entrevista com a psicóloga especialista Juliana Melo, originalmente veiculada no programa Conexão Senado, da Radio Senado, em 18 de fevereiro de 2022.

Conexão Senado (Adriano Faria): Classificado como Transtorno do Espectro Autista, a Síndrome de Asperger atinge cerca de dois por cento da população. E esta sexta-feira, 18 de fevereiro, é o Dia Internacional da Síndrome de Asperger, uma iniciativa para conscientizar a população sobre esse transtorno. Para falar sobre o assunto nós convidamos a psicóloga Juliana Melo, pós-graduada em Transtorno do Espectro Autista:

Conexão Senado: Juliana, quando se fala de autismo muita gente acha que se trata de uma coisa só, você poderia explicar para gente os diferentes níveis do transtorno do espectro autista e como a Síndrome de Asperger se enquadra nessa classificação?

Juliana Melo: Sim, Adriano, até 2013 nós tínhamos o DSM-4 que trazia 4 nomenclaturas separadas, que era o transtorno autista, a Síndrome de Asperger, o Transtorno Desintegrativo Infantil e o [Transtorno] Invasivo do Desenvolvimento. Com a chegada do DSM-5 que foi em 2013, esses quatro transtornos fizeram parte de um espectro, então alterou-se o Transtorno do Autismo para Transtorno do Espectro Autista que é atualmente conhecido como TEA. A partir disso o Asperger ele está fazendo parte desse espectro, espectro a gente entende como se fosse um guarda-chuva que é algo mais abrangente, então ele entra no que a gente chama e entende como nível 1 de funcionamento. A partir dessa mudança que o DSM [5] trouxe entende-se como o TEA nível um, dois e três, como isso funciona na prática? Antigamente falava-se em nível leve, moderado e severo os autistas quando eram diagnosticados, isso mudou, então quando a gente fala nível 1, 2 e 3 está muito mais ligado a questões de suporte, o quanto que esse indivíduo precisa de suporte para desempenhar as funções do dia a dia, questão da independência e autonomia. Então, por exemplo, o nível 1 está muito mais ligado a questões sociais, a repertório limitado na socialização a questão de comunicação pode ser um pouco mais robotizada, são pessoa que trabalham, têm uma vida independente, porém sentem que em algum  momento há algo errado e que elas não se enquadram tão bem quanto uma pessoas típica, mas também estão tão distantes assim como um nível 3, por exemplo, que é algo muito mais complexo e o prejuízo é muito maior, é um atraso global que a gente pode perceber desde a infância e o nível 2 são questões mais acentuadas relacionadas a linguagem, relacionadas também a comportamentos repetitivos e também a socialização.

Conexão Senado:  Então fica claro que, por exemplo, quem tem Síndrome de Asperger, pelo que eu entendi, precisaria de menos suporte para as suas atividades. Como é feito o diagnóstico da Síndrome de Asperger?

Juliana Melo: O diagnóstico, geralmente para a Síndrome de Asperger ele é um pouco mais tardio. Por quê? Porque passa desapercebido na maioria das vezes, porque a criança, ela consegue acompanhar os seus colegas. Ela faz muitas vezes um esforço muito maior para que isso aconteça, não é algo tão natural, mas ainda assim ela consegue dar conta das atividades do dia a dia, então essa é até uma preocupação atualmente em relação a esse diagnóstico que a gente sabe que um diagnóstico precoce contribui muito no prognóstico do desenvolvimento da pessoa. No caso desses diagnósticos, eles podem ser feitos por qualquer profissional que tenha conhecimento em autismo, então um professor que tem uma desconfiança em sala de aula, o pediatra, um terapeuta. Porém ele só é validado em consulta com neurologista ou neuropediatra e psiquiatra que também pode ser um psiquiatra infantil, mas qualquer pessoa que tenha o conhecimento e tenha a desconfiança deve encaminhar esse sujeito para um acompanhamento ou até mesmo para uma investigação. Existem alguns testes que são usados M-CHAT** e o ADOS*** e o que compõe também são entrevistas, observações. Os pediatras geralmente usam do M-CHAT para fazer esse levantamento, essa investigação. Não é um teste que vai trazer esse diagnóstico, então é uma soma de fatores, de aspectos é algo que deve ser feito com muita certeza , então muitas vezes a gente  percebe que em uma consulta a criança sai laudada e isso muitas vezes acarreta na vida dela uma série de questões e que a gente percebe que era falta de estimulação, por exemplo,  que a criança não chega a ter um diagnóstico, mas que precisava ser mais estimulada, então é necessário ter muita responsabilidade nesse momento do diagnóstico também.

Conexão Senado: Você falou, Juliana, sobre diagnóstico a importância de um diagnóstico que seja feito logo e aí vamos já para o tratamento. Como é o tratamento de quem tem Síndrome de Asperger se esse tratamento está disponível no SUS?

Juliana Melo: Existe um projeto de lei, que torna obrigatório centros de assistência integral às pessoas com autismo, só que está em trâmite desde 2018, então ainda não foi aprovado, porém já existem centros que atendem pelo SUS e que são específicos no atendimento a pessoas com autismo. A gente sabe que também existe obrigatoriedade de atendimento do SUS a questões de saúde mental, porém é algo mais abrangente, no caso das pessoas com autismo é ideal que haja um trabalho específico direcionado para ele[paciente]. Então existe esse acompanhamento pelo SUS, a gente sabe que é um pouco mais lento o processo, é sobrecarregado o sistema [SUS], porém, em Curitiba teve em 2019, em setembro de 2019, teve a inauguração do CEETEA, que é um Centro de Ensino Estruturado para o Transtorno do Espectro Autista. Eles trabalham somente com o Transtorno do Espectro Autista e isso foi muito bacana porque de certa forma contribui para que mais pessoas tenham acesso a esse tratamento, temos também aqui em Curitiba o Ambulatório Encantar e eu vi que em algumas regiões pelo Brasil já existem esses centros especializados que atendem pelo SUS. Como pode ser adquirido esse tratamento? Geralmente através da UBS [Unidade Básica de Saúde] ou alguns hospitais, os pais conseguem um encaminhamento para a criança começar esse tratamento através do SUS. O tratamento geralmente é em equipe multidisciplinar então tem que ter pelo menos um psicólogo, um fonoaudiólogo, um terapeuta ocupacional e em casos de atraso motor um fisioterapeuta. no caso do autismo leve, do Asperger dependendo do nível de suporte que o sujeito requer, se ele tem condições de se manter socialmente, não apresenta atraso na fala é uma pessoa muito funcional, muitas vezes somente o psicólogo já consegue fazer um trabalho satisfatório, não precisa dessa equipe de apoio, mas o ideal seria a equipe multidisciplinar.

Conexão Senado:   Qual a importância da data de hoje não só para quem tem a síndrome, mas para a família e para as pessoas que convivem com quem tem a Síndrome de Asperger, por exemplo, na escola, no trabalho ou em outras áreas, qual a importância de uma data como a de hoje?

Juliana Melo:  Por mais que o termo Asperger ele não seja mais tão utilizado, não que esteja errado de utilizar, mas hoje em dia se fala muito mais em autismo nível 1  eu acho fundamental  que existam datas como essa, que independente dessa mudança de nomenclatura, DSM, ela destaca  a necessidade da sociedade olhar para essas diferenças porque quando as pessoas dizem “Ah, somo todos iguais e devemos nos respeitar” é justamente ao contrário , nós somos todos diferentes, independente  se neurotipico  ou atipico é preciso  dar visibilidade a isso, a essas diferenças, é preciso dar voz a essas pessoas, é preciso que a sociedade além de respeitar ela ofereça  no âmbito educacional, profissional e em qualquer outro espaço que essas pessoas possam ocupar, esse respeito e para isso existir é necessário existir um conhecimento , o que é essa Síndrome de Asperger, o que é o autismo e não somente o autismo, mas síndromes raras e qualquer outra diferença que possa existir entre nós, para que a sociedade também se prepare para receber e acolher essas pessoas. Muitas vezes a gente vê crianças que passam por terapia desde pequenos para tentar se moldar a sociedade, para tentar ser o máximo funcional que eles podem. E como a sociedade está lidando com isso, qual o preparo que nós temos nesses lugares, nesses ambientes profissionais, de educação, como está sendo feito para que essas pessoas sejam acolhidas, sejam respeitadas, nesses espaços. Então eu acho fundamental essa data

Conexão Senado (Adriano Faria): Juliana Melo, psicóloga, muito obrigado pela entrevista, pelos esclarecimentos sobre a Síndrome de Asperger e até uma próxima oportunidade.

Juiana Melo: Eu que agradeço a oportunidade e sempre que precisarem contem comigo. Um abraço a todos e um bom final de semana.

*DSM-5: O DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) é um manual de diagnósticos em saúde mental que padroniza sintomas e comportamentos comuns em diferentes condições . Ele foi criado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA) para auxiliar o trabalho de profissionais de saúde mental em todo o mundo. O DSM-5 é utilizado para o diagnóstico de transtornos mentais, incluindo transtornos do espectro autista, transtornos de ansiedade, transtornos alimentares, transtornos de humor, transtornos de personalidade, transtornos psicóticos e transtornos relacionados a substâncias. O manual é atualizado periodicamente para refletir os avanços científicos na área da saúde mental.

**M-CHAT: A Escala M-CHAT é uma ferramenta de triagem para o Transtorno do Espectro Autista (TEA) que avalia habilidades da criança nas áreas da linguagem, comunicação, atenção e comportamento. Ela é uma escala de rastreamento que pode ser utilizada em todas as crianças durante visitas pediátricas com objetivo de identificar traços de autismo em crianças de idade precoce.

***ADOS: A Escala ADOS (Autism Diagnostic Observation Schedule) é uma ferramenta de avaliação para o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) . Ela é uma escala de observação que avalia habilidades sociais, de comunicação e comportamento de pessoas com TEA, desde crianças até adultos. O ADOS é uma avaliação estruturada e completa que usa situações sociais planejadas para ter respostas e interações interpessoais. A avaliação é dividida em quatro módulos, cada um apropriado para crianças e adultos de diferentes níveis de desenvolvimento e linguagem, podendo ser verbal e não verbal. O ADOS é uma das escalas mais utilizadas para o diagnóstico do TEA, juntamente com a Escala ADI-R (Autism Diagnostic Interview-Revised)


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